Segunda leitura
Do Tratado sobre o benefício da morte, de Santo Ambrósio, bispo
(Cap. 3,9; 4,15: CSEL 32,710.716-717)
(Séc. IV)
Levemos sempre em nós a morte de Cristo
Disse o Apóstolo: Para mim o mundo está
crucificado, e eu, para o mundo (Gl 6,14). Para que saibamos, por fim, que
nesta vida há morte e boa morte, exorta-nos a que levemos a morte de Jesus
em nosso corpo (cf. 2Cor 4,10).
Pois quem tiver em si a morte de Jesus, precisa também
ter em seu corpo a vida do Senhor Jesus. Atue, portanto, a morte em nós, para
que também possa agir a vida. Vida excelente depois da morte, isto é, vida
excelente depois da vitória, vida excelente, terminado o combate. Nela a lei da
carne já não luta contra a lei do espírito, não há mais em nós peleja da morte
contra o corpo, mas no corpo, a vitória sobre a morte. E francamente não sei
qual tem maior força, esta morte ou a vida. É claro que atendo à autoridade do
Apóstolo que diz: Portanto a morte age em nós, mas a vida, em vós (2Cor
4,12). A morte de um só a quanta gente faz crescer a vida! Por isto ensina ser
desejável esta morte aos que ainda estão nesta vida, para que refulja em nossos
corpos a morte de Cristo, aquela ditosa pela qual se destrói o ser exterior, a
fim de ser renovado nosso homem interior (cf. 2Cor 2,16) e se desfaça
nossa habitação terrena (cf. 2Cor 5,1), abrindo-se assim para nós a
habitação celeste.
Imita, portanto, a morte, que se separa da união com
esta carne e desata os laços de que fala o Senhor mediante Isaías: Desata as
cadeias iníquas, solta os laços das altercações violentas, deixa livres os
oprimidos, rompe todo limite injusto (Is 58,6).
O Senhor aceitou sujeitar-se à morte para que a culpa
desaparecesse. Mas, para não ser de novo a morte o fim da natureza humana,
foi-lhe dada a ressurreição dos mortos, para que pela morte se apagasse a
culpa, pela ressurreição se perpetuasse a natureza.
Por isso, a morte é a passagem de tudo. É preciso que
passes continuamente; passagem da corrupção para a incorrupção, da condição
mortal à imortalidade, das perturbações para a tranquilidade. Por isto não te
assuste a palavra morte, mas os benefícios da boa passagem te alegrem. Pois,
que é a morte a não ser a sepultura dos vícios, o despertar das virtudes? Por
isto disse ele: Morra minha alma nas almas dos justos (Nm 23,10), quer
dizer, seja consepultada para depor seus vícios, assumir a graça dos justos,
que trazem no corpo e na alma a morte de Cristo.
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