quarta-feira, 24 de novembro de 2021

SANTO ANDRÉ DUNG-LAC, PRESBÍTERO, E SEUS COMPANHEIROS, MÁRTIRES

 No extremo oriente da Ásia, nas regiões do Vietnã de hoje, o Evangelho já vinha sendo anunciado desde o século XVI. Contudo, de 1625 a 1886, excetuados breves períodos de paz, os governantes dessas regiões tudo fizeram para despertar o ódio contra a religião cristã e os discípulos de Cristo. Quanto mais perseguidos, maior o fervor cristão, tendo como resultado um elevadíssimo número de mártires. O Papa João Paulo II, no dia 19 de junho de 1988, inscreveu 117 deles no rol dos santos mártires. Entre eles, contam-se 11 missionários dominicanos espanhóis, 10 franceses e 96 mártires vietnamitas. Oito são bispos, 50 sacerdotes e 59 leigos, de diversas idades e condições sociais, na maioria pais e mães de família e, alguns, catequistas, seminaristas e militares.

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Segunda leitura 

Da Carta de Paulo Le Bao-Tinh aos alunos do Seminário de Ke-Vinh, de 1843

(Launay, A., Le clergé tonkiois et se prêtres martyrs, MEP, Paris, 1925, pp. 80-83)
(Séc. XIX)

A participação dos mártires na vitória de Cristo Rei 


Eu, Paulo, preso pelo nome de Cristo, quero levar ao vosso conhecimento as minhas tribulações cotidianas que me assaltam de todos os lados, para que, inflamados pelo amor de Deus, possais louvá-lo, porque a sua misericórdia é eterna (Sl 117,1).

O meu cárcere é verdadeiramente uma imagem do fogo eterno. Aos cruéis suplícios de todo gênero, como grilhões, algemas e ferros, juntam-se ódio, vingança, calúnias, palavrões, acusações, maldades, falsos testemunhos, maldições e, finalmente, angústia e tristeza. Mas Deus, que outrora libertou os três jovens da fornalha acesa, sempre me assiste e libertou-me dessas tribulações, que se tornaram suaves, porque a sua misericórdia é eterna!
Graças a Deus, no meio desses tormentos que continuam a apavorar os outros, sinto-me alegre e contente, pois não me julgo só, mas com Cristo. Nosso Mestre suporta todo o peso da cruz, deixando-me apenas uma pequena e ínfima parte: não é só testemunha do meu combate, mas combatente, vencedor e consumador de toda luta. Assim, sobre sua cabeça é que foi colocada a coroa da vitória, de cujo triunfo participam também os seus membros.
Como, porém, Senhor, suportar tal espetáculo, ao ver diariamente os imperadores, os mandarins e seus soldados blasfemarem vosso santo nome, quando estais acima dos querubins e serafins? (cf. Sl 79,3). Eis que a vossa cruz é calcada pelos pagãos! Onde está a vossa glória? Ao ver tudo isso, me inflamo por vós, preferindo morrer com os membros amputados, em testemunho do vosso amor!
Mostrai, Senhor, o vosso poder, salvando-me e protegendo-me. Que a força se manifeste na minha fraqueza e seja glorificada ante os gentios, pois, se eu vacilar no caminho, vossos inimigos, cheios de orgulho, poderão levantar as cabeças.
Caríssimos irmãos, ao ouvirdes tudo isto, dai alegremente graças imortais a Deus, do qual procedem todos os bens. Bendizei comigo o Senhor, porque a sua misericórdia é eterna! Minha alma engrandeça o Senhor e meu espírito exulte de alegria em Deus, meu Salvador; porque olhou para a humildade de seu servo (cf. Lc 1,46-48), todas as gerações me proclamarão bendito, porque a sua misericórdia é eterna!
Cantai louvores ao Senhor, todas as gentes, povos todos, festejai-o (Sl 116,1), porque Deus escolheu o que é fraco no mundo para confundir os fortes, e o que é vil e desprezível (1Cor 1,27-28), para confundir os nobres. Pelos meus lábios e inteligência, Deus confunde os filósofos, os discípulos dos sábios deste mundo, porque a sua misericórdia é eterna!
Tudo isto vos escrevo, para unirdes à minha a vossa fé. No meio desta tempestade lanço a âncora, a viva esperança que trago no coração, até ao trono de Deus.
Caríssimos irmãos, correi de tal modo que possais alcançar a coroa: revesti-vos com a couraça da fé (1Ts 5,8), tomai as armas de Cristo, à direita e à esquerda, segundo os ensinamentos de São Paulo, meu patrono. É melhor para vós entrar na posse da vida com um só olho ou privados de algum membro (cf. Mt 5,29), do que serdes lançados fora com todos eles.
Vinde em meu auxílio com vossas preces, para que possa combater, segundo a lei, o bom combate, e combater até o fim, encerrando gloriosamente a minha carreira. Se já não nos podemos ver nesta vida, tal felicidade nos está reservada para o futuro, quando, junto ao trono do Cordeiro imaculado, exultantes com a alegria da vitória, cantaremos em uníssono eternamente os seus louvores. Assim seja.

terça-feira, 23 de novembro de 2021

SÃO COLUMBANO, ABADE

 Nasceu na Irlanda na primeira metade do século VI, e estudou ciências sagradas e humanas. Tendo abraçado a vida monástica, partiu para a França, onde fundou muitos mosteiros que governou com austera disciplina. Obrigado a exilar-se, foi para a Itália, onde fundou o mosteiro de Bobbio. Depois de ter exercido tão intensa atividade para promover a vida cristã e religiosa do seu tempo, morreu no ano 615.

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Segunda leitura

Das Instruções de São Columbano, abade

(Instr. 11,1-2: Opera, Dublin 1957,106-107)
(Séc.VII)

A grande dignidade do homem está
na semelhança com Deus, se bem guardada

Moisés escreveu na lei: Deus fez o homem à sua imagem e semelhança (cf. Gn 1,27.26). Considerai, peço-vos, a dignidade destas palavras! O Deus onipotente, invisível, incompreensível, inefável, insuperável, ao formar do barro o homem, enobreceu-o com a beleza de sua imagem. Que é o homem comparado a Deus? E a terra comparada ao espírito? Pois Deus é espírito (Jo 4,24). Grande condescendência: Deus concedeu ao homem a imagem de sua eternidade e a semelhança de seu agir. Grande dignidade: a semelhança de Deus, se bem guardada.
Por conseguinte, se usar corretamente das virtudes infundidas na alma, então será semelhante a Deus. Todas as virtudes que Deus, na primeira criação, semeou em nós, ensinou-nos a fazê-las, por nossa vez, voltar para ele através dos mandamentos. O primeiro destes é: Amarás de todo o coração a nosso Senhor, porque ele nos amou primeiro, desde o início, antes que existíssemos. O amor de Deus é a renovação da imagem. Ama a Deus quem guarda seus mandamentos; assim disse: Se me amais, guardai meus mandamentos (Jo 14,15). É seu mandamento, o mútuo amor: Meu mandamento é que vos ameis uns aos outros, como também eu vos amei (Jo 15,12).
O verdadeiro amor, porém, não está na palavra, mas no gesto e na verdade (1Jo 3,18). Restituamos, portanto, a nosso Deus, a nosso Pai, sua imagem inviolada na santidade, porque ele é santo: Sede santos, porque eu sou santo (Lv 11,44); na caridade, pois ele é caridade, segundo João: Deus é caridade (1Jo 4,18); na piedade e na verdade, porque ele é pio e veraz. Não sejamos pintores de imagem alheia; é pintor de imagem roubada quem é feroz, quem é colérico, quem é soberbo.
Não aconteça introduzirmos em nós imagens roubadas, pinte em nós Cristo sua imagem, ao dizer: Eu vos dou a minha paz, deixo-vos a minha paz (Jo 14,27). Mas, que nos adianta saber que a paz é boa, se não a conservamos bem? O ótimo costuma ser fragilíssimo e as coisas preciosas exigem maior cautela e guarda mais solícita; muitíssimo frágil é aquilo que se perde com a menor palavra e se desfaz com a menor ofensa ao irmão. Nada mais agradável para o homem do que proferir a todo momento palavras ociosas e falar mal dos ausentes. Por isto quem não pode dizer: O Senhor deu-me uma língua erudita para poder sustentar com a palavra o abatido (Is 50,4), cale-se e se disser algo, que seja de paz.

SÃO CLEMENTE I, PAPA E MÁRTIR

 Depois de Pedro, Clemente foi o terceiro a governar a Igreja de Roma, em fins do século I. Escreveu uma importante carta aos coríntios para restabelecer entre eles a paz e a concórdia.

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Segunda leitura

Da Carta aos coríntios, de São Clemente I, papa

(Cap. 35,1-5; 36,1-2; 37,1.4-5; 38,1-2.4: Funk 1,105-109)

(Séc. I)

Os dons de Deus são admiráveis
Caríssimos, como são maravilhosos, como são preciosos os dons de Deus! Vida imortal, esplêndida justiça, verdade liberta, fé intrépida, temperança santa: tudo isto nossa inteligência concebe. O que será então que se prepara para aqueles que o aguardam? O santíssimo Artífice e Pai dos séculos é o único a conhecer a sua santidade e beleza. Portanto, a fim de participarmos dos dons prometidos, empreguemos todo empenho em ser contados no número dos que o esperam.

E como se fará isto, diletos? Estabilizando o nosso pensamento em Deus pela fé; procurando com diligência tudo o que lhe é agradável e aceito; fazendo tudo o que se relaciona com a sua vontade irrepreensível; seguindo o caminho da verdade e rejeitando para longe de nós toda injustiça, iniqüidade, cobiça, contestações, maldades e fraudes.

É este, queridos, o caminho onde encontramos a salvação: Jesus Cristo, o pontífice de nossas oblações, o defensor e o auxílio em nossa fraqueza. Por ele, vemos as profundezas dos céus; por ele contemplamos seu excelso rosto imaculado; por ele foram abertos os olhos do coração; por ele nossa mente, insensata e obscurecida, desabrocha na luz; por ele, o Senhor quis que provássemos da ciência imortal; por ele que é o esplendor da majestade de Deus, e está tão mais alto que os anjos, quanto o nome que recebeu é mais excelente (cf. Hb 1,3-4).

Combatamos, portanto, irmãos, com todo o vigor, sob seus preceitos irrepreensíveis. Não podem manter-se os grandes sem os pequenos, nem os pequenos sem os grandes: estão misturados e daí sua vantagem. Sirva-nos de exemplo nosso corpo. A cabeça nada é sem os pés como também os pés sem a cabeça; os menores membros são necessários e úteis a nosso corpo todo; ou melhor, todos estão bem entrosados e se sujeitam unanimemente, para que todo o corpo se salve.

Com efeito, nosso corpo todo se salvará em Cristo Jesus. Assim, cada qual se submeta a seu próximo em conformidade com o dom que por graça lhe foi concedido: o forte proteja o fraco, o fraco respeite o forte; o rico dê ao pobre, o pobre agradeça a Deus por ter-lhe concedido quem o ajude em sua indigência; o sábio, não por palavras, mas pelas boas obras, manifeste sua sabedoria; o humilde não se elogie a si mesmo, mas deixe que outros o façam. Recebamos, assim, todas as coisas de suas mãos. Por tudo devemos dar graças a ele, a quem a glória pelos séculos dos séculos. Amém.

segunda-feira, 22 de novembro de 2021

SANTA CECÍLIA, VIRGEM E MÁRTIR

 Memória

 O culto de Santa Cecília, que deu o nome a uma basílica construída em Roma no século V, difundiu-se amplamente a partir da narração do seu Martírio em que ela é exaltada como exemplo perfeitíssimo de mulher cristã, que abraçou a virgindade e sofreu o martírio por amor de Cristo.

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Segunda leitura

 Dos Comentários sobre os Salmos, de Santo Agostinho, bispo

(Ps 32, sermo 1,7-8: CCL 38,253-254)

(Séc.V)

 Cantai a Deus com arte e com júbilo

Louvai o Senhor com a cítara, na harpa de dez cordas Salmodiai! Cantai-lhe um cântico novo! (Sl 32,2.3). Despojai-vos da velhice; conhecestes um cântico novo! Novo homem, nova aliança, novo cântico. O cântico novo não pertence aos homens velhos. Somente o aprendem os homens novos, renovados da velhice pela graça e já pertencentes à nova aliança, que é o reino dos céus. Por ele anseia todo o nosso amor e canta um cântico novo. Cante o cântico novo não a língua mas a vida.

Cantai-lhe um cântico novo, cantai bem para ele! Alguém pergunta como cantar para Deus. Canta para ele, mas não cantes mal. Ele não quer que seus ouvidos sejam molestados. Cantai bem, irmãos. Diante de um musicista de bom ouvido, dizem-te para cantar de modo que lhe agrade. Ora se não foste instruído na arte musical,temes cantar para não desagradar ao artista. Não sabendo que és ignorante, ele te repreenderá. Quem se oferecerá para cantar bem a Deus, a ele que de tal modo julga o cantor, de tal modo examina tudo, de tal modo sabe escutar? Quando poderás apresentar um canto com tanta arte que absolutamente em nada desagrades aos ouvidos perfeitos?

 Eis que ele te dá um modo de cantar: não procures palavras, como se pudesses explicar aquilo com que Deus se deleita. Canta na jubilação. É isto cantar bem para Deus, cantar na jubilação. O que é cantar no júbilo? Escuta, não se pode expressar por palavras aquilo que se canta no coração. De fato, aqueles que cantam seja na ceifa, seja na vinha, seja em qualquer outro trabalho cheio de ardor, começam com palavras de cantigas a exultar com alegria; depois, a alegria é tanta que já não podem dizê-la, então abandonam as sílabas das palavras e deixam-se levar pelo som do júbilo.

 Júbilo é um som a significar que do coração brota algo impossível de se expressar. E quem merece esta jubilação, a não ser o Deus inefável? É inefável o que não podes falar. E se não o podes falar e não deves calar-te, o que te resta senão jubilar? Alegre-se o coração sem palavras, e a imensidão das alegrias não conheça o limite das sílabas. Cantai para ele com arte e com júbilo (cf. Sl 32,3).

domingo, 21 de novembro de 2021

APRESENTAÇÃO DE NOSSA SENHORA

 Memória

Neste dia da dedicação (ano 543) da igreja de Santa Maria a Nova, construída perto do templo de Jerusalém, celebramos, juntamente com os cristãos da Igreja Oriental, a "dedicação" que Maria fez de si mesma a Deus, já desde a infância, movida pelo Espírito Santo que a encheu de graça desde a sua imaculada conceição.
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Segunda leitura

Dos Sermões de Santo Agostinho, bispo

(Sermo 25,7-8: PL 46,937-938)
(Séc. V)

Aquela que acreditou em virtude da fé,
também pela fé concebeu

Prestai atenção, rogo-vos, naquilo que Cristo Senhor diz, estendendo a mão para seus discípulos: Eis minha mãe e meus irmãos. Quem faz a vontade de meu Pai que me enviou, este é meu irmão, irmã e mãe (Mt 12,49-50). Acaso não fez a vontade do Pai a Virgem Maria, que creu pela fé, pela fé concebeu, foi escolhida dentre os homens para que dela nos nascesse a salvação e que foi criada por Cristo antes que Cristo nela fosse criado? Sim! Ela o fez! Santa Maria fez totalmente a vontade do Pai e por isto mais valeu para ela ser discípula de Cristo do que mãe de Cristo; maior felicidade gozou em ser discípula do que mãe de Cristo. Assim Maria era feliz porque, já antes de dar à luz o Mestre, trazia-o na mente.

Vede se não é assim como digo. O Senhor passava acompanhado pelas turbas, fazendo milagres divinos, quando certa mulher exclamou: Bem-aventurado o seio que te trouxeFeliz o ventre que te trouxe! (Lc 11,27) O Senhor, para que não se buscasse a felicidade na carne, que respondeu então? Muito mais felizes os que ouvem a palavra de Deus e a guardam (Lc 11,28). Por conseguinte, também aqui é Maria feliz, porque ouviu a palavra de Deus e a guardou. Guardou a verdade na mente mais do que a carne no seio. Verdade, Cristo; carne, Cristo; a verdade-Cristo na mente de Maria; a carne-Cristo no seio de Maria. É maior o que está na mente do que o trazido no seio.

Santa Maria, feliz Maria! Contudo, a Igreja é maior que a Virgem Maria. Por quê? Porque Maria é porção da Igreja, membro santo, membro excelente, membro supereminente, mas membro do corpo total. Se ela pertence ao corpo total, logo é maior o corpo que o membro. A cabeça é o Senhor; e o Cristo total, é a cabeça e o corpo. Que direi? Temos cabeça divina, temos Deus por cabeça!

Portanto, irmãos, dai atenção a vós mesmos. Também vós sois membros de Cristo, também vós sois corpo de Cristo. Vede de que modo o sois. Diz: Eis minha mãe e meus irmãos (Mt 12,49). Como sereis mãe de Cristo? Todo aquele que ouve e faz a vontade de meu Pai que está nos céus, este é meu irmão e irmã e mãe (cf. Mt 12,50). Pensai: entendo irmão, entendo irmã; é uma só a herança, e é essa a misericórdia de Cristo que, sendo único, não quis ficar sozinho; quis que fôssemos herdeiros do Pai, co-herdeiros seus.