Dos Sermões de São Fausto de Riez, bispo
(Sermo 5, de Epiphania 2: PLS 3,
560-562)
(Séc. V)
As
núpcias de Cristo e da Igreja
No terceiro
dia, houve um casamento (Jo 2,1). Que casamento é este senão as promessas e as alegrias da
salvação humana, insinuada no significado místico do número três, quer em
referência à proclamação da Trindade quer à fé na ressurreição do Senhor ao terceiro dia? No mesmo sentido se lê
também noutra passagem do Evangelho, que o regresso do filho pródigo, símbolo
da conversão dos pagãos, foi celebrado com música, danças e vestes nupciais.
Por isso, como
um esposo que se levanta do quarto nupcial (Sl 18,6), Cristo veio à terra a fim de unir-se pela encarnação à Igreja em
que haviam de reunir-se os povos pagãos. Deu-lhe penhor e dote: penhor, quando
Deus se uniu ao homem; dote, quando se imolou pela salvação do homem. Pelo
penhor, entendemos a presente redenção; pelo dote, a vida eterna. Tudo isso
eram milagres para os que viam; e mistério para os que compreendiam seu
sentido. Se considerarmos com atenção, veremos que a própria água, transformada
em vinho, nos apresenta, de certo modo, a imagem do batismo e da vida nova. De
fato, quando algo se transforma interiormente, quando uma criatura passa de um
estado inferior a outro melhor por uma íntima mudança, realiza-se o mistério de
um segundo nascimento. As águas são repentinamente transformadas, para em
seguida transformar os homens.
Na Galiléia, por intervenção de Cristo, a
água transformou-se em vinho, quer dizer, cessa a lei e sucede-lhe a graça; as
sombras são desfeitas e a verdade se manifesta; as coisas materiais cedem às
espirituais; a lei antiga se transforma no Novo Testamento. Como diz o Apóstolo,
o mundo velho desapareceu; tudo agora é
novo (2Cor 5, 17). E assim como a água contida nas talhas nada perde do que
era e começa a ser o que não era, também a lei não deixa de existir, mas se
aperfeiçoa com a vinda de Cristo.
Tendo faltado uma qualidade de vinho,
serviu-se outra. É certamente bom o vinho do Antigo Testamento, mas o do Novo é
melhor. O Antigo Testamento, que os judeus observam, dilui-se na letra; o Novo,
que seguimos, tem o sabor da vida da graça. Considera-se bom vinho o bom
preceito da lei, quando ouves: Amarás o
teu próximo e odiarás o teu inimigo (Mt 5,43). Melhor, contudo, e mais
forte é o vinho do Evangelho, quando ouves: Eu,
porém, vos digo: amai os vossos inimigos e rezai por aqueles que vos perseguem
(Mt 5,44).