sábado, 2 de maio de 2020

Sábado da 3ª semana da Páscoa

Segunda leitura
Do Comentário sobre o Evangelho de São João, de São Cirilo de Alexandria, bispo
 (Lib. 4,2: PG 73,563-566)   
(Séc.V)
 Cristo entregou seu corpo para a vida de todos
 Eu morro por todos, diz o Senhor, a fim de que por mim todos tenham vida. Eu morro para resgatar todos pela minha carne! A morte morrerá em minha morte e, juntamente comigo, a natureza humana que caíra, ressuscitará.
 Para tanto tornei-me semelhante a vós, um homem autêntico da descendência de Abraão, a fim de ser semelhante a meus irmãos. São Paulo compreendeu isto perfeitamente, ao dizer: Visto que os filhos têm em comum a carne e o sangue, também Jesus participou da mesma condição, para assim destruir, com a sua morte, aquele que tinha o poder da morte, isto é, o demônio (Hb 2,14).
 Ora, aquele que tinha o poder da morte, e por conseguinte, a própria morte, não poderia ser destruído de nenhuma outra maneira, se Cristo não tivesse se oferecido em sacrifício por nós. Um só foi imolado pela redenção de todos, porque a morte dominava sobre todos.
Por isso diz-se nos salmos que Cristo se ofereceu a Deus Pai como sacrifício imaculado: Sacrifício e oblação não quisestes, mas formastes-me um corpo; não pedistes ofertas nem vítimas, holocaustos por nossos pecados. E então eu vos disse: “Eis que venho” (Sl 39,7-9).
 O Senhor foi crucificado por todos e por causa de todos a fim de que, tendo um morrido por todos, vivamos todos nele. Não seria possível que a vida permanecesse sujeita à morte ou sucumbisse à corrupção natural. Sabemos pelas próprias palavras de Cristo que ele ofereceu sua carne pela vida do mundo: Eu me consagro por eles (Jo 17,19).
Com isso ele quer dizer que se consagra e se oferece como sacrifício puro de suave perfume. Com efeito, tudo o que era oferecido sobre o altar, era santificado ou chamado santo, conforme a Lei. Cristo, portanto, entregou seu corpo em sacrifício pela vida de todos e assim a vida nos foi dada de novo por meio dele. Como isso se realizou, procurarei dizer na medida do possível.
 Depois que o Verbo de Deus, que tudo vivifica, assumiu a carne, restituiu à carne o seu próprio bem, isto é, a vida. Estabeleceu com ela uma comunhão inefável, e tornou-a fonte de vida, como ele mesmo o é por natureza.  Por conseguinte, o corpo de Cristo dá a vida a todos os que dele participam; repele a morte dos que a ele estão sujeitos e os libertará da corrupção, porque possui em si mesmo a força que a elimina plenamente.

sexta-feira, 1 de maio de 2020

Sexta-feira da 3ª semana da Páscoa

Segunda leitura
Dos Sermões de Santo Efrém, diácono
 (Sermo de Domino nostro, 3-4.9:
Opera edit. Lamy, 1,152-158.166-168)
 (Séc. IV)
 A cruz de Cristo, salvação para o gênero humano
Nosso Senhor foi calcado pela morte mas, por sua vez, esmagou-a como quem soca com os pés o pó da estrada. Sujeitou-se à morte e aceitou-a voluntariamente, para destruir aquela morte que não queria morrer. Nosso Senhor saiu para o Calvário  carregando a cruz, para satisfazer as exigências da morte; mas, ao soltar um brado do alto da cruz, fez sair os mortos dos  sepulcros, vencendo a oposição da morte. A morte o matou no corpo que assumira; mas ele, com as mesmas armas, saiu vitorioso da morte. A divindade ocultou-se sob a humanidade e assim aproximou-se da morte, que matou, mas também foi morta. A morte matou a vida natural e, por sua vez, foi morta pela vida sobrenatural.
A morte não poderia devorá-lo se ele não tivesse um corpo nem o inferno tragá-lo se não tivesse carne. Foi por isso que desceu ao seio de uma Virgem para tomar um corpo que o conduzisse à mansão dos mortos. Com o corpo que assumira, lá entrou para destruir suas riquezas e arruinar seus tesouros.
 A morte foi ao encontro de Eva, a mãe de todos os viventes. Ela é como uma vinha cuja cerca foi aberta pela morte, por meio das próprias mãos de Eva, para que pudesse provar de seus frutos. Então Eva, mãe de todos os viventes, tornou-se fonte da morte  para todos os viventes.  Floresceu, porém, Maria, a nova videira, em lugar de Eva, a antiga videira; nela habitou Cristo, a nova vida, a fim de que, ao aproximar-se a morte com sua habitual segurança para alimentar a fome devoradora, encontrasse ali escondida, no seu fruto mortal, a Vida destruidora da morte. Quando, pois, a morte engoliu sem temor o fruto mortal, ele  libertou a vida e com ela, multidões.
 O admirável filho do carpinteiro, que levou sua cruz até os abismos da morte que tudo devoravam, também levou o gênero humano para a morada da vida. E uma vez que o gênero humano, por causa de uma árvore, tinha se precipitado no reino das sombras, sobre outra árvore passou para o reino da vida. Na mesma árvore em que fora enxertado um fruto amargo, foi enxertado depois um fruto doce, para que reconheçamos o Senhor a quem criatura alguma pode resistir.
 Glória a vós, que lançastes a cruz como uma ponte sobre a morte, para que através dela as almas possam passar da região da morte para a vida!  Glória a vós, que assumistes um corpo de homem mortal, para transformá-lo em fonte de vida para todos os mortais!  Vós viveis para sempre! Aqueles que vos mataram, trataram vossa vida como os agricultores: enterraram-na como o grão de trigo; mas ela ressuscitou e, junto com ela, fez ressurgir uma multidão de seres humanos.
 Vinde, ofereçamos o grande e universal sacrifício do nosso amor. Entoemos com grande alegria cânticos e orações àquele que se ofereceu a Deus no sacrifício da cruz, para nos enriquecer por meio dela com a abundância de seus dons.

quinta-feira, 30 de abril de 2020

Quinta-feira da 3ª semana da Páscoa

 Segunda leitura
Do Tratado contra as heresias, de Santo Irineu, bispo
 (Lib. 5,2,2-3:SCh153,30-38)     (Séc.I)
 A Eucaristia, penhor da resurreição
 Se não há salvação para a carne, também o Senhor não nos redimiu com o seu sangue. Sendo assim, nem o cálice da eucaristia é a comunhão do seu sangue nem o pão que partimos é a comunhão do seu corpo. O sangue, efetivamente, procede das veias, da carne, e do que pertence à substância humana. Essa substância, o Verbo de Deus assumiu-a em toda a sua realidade e por ela nos resgatou com o seu sangue, como afirma o Apóstolo: Pelo seu sangue, nós fomos libertados. Nele, as nossas faltas são perdoadas (Ef 1,7).
 Nós somos seus membros e nos alimentamos das coisas criadas que ele próprio nos dá, fazendo nascer o sol e cair a chuva segundo sua vontade. Por isso, o Senhor declara que o cálice, fruto da criação, é o seu sangue, que fortalece o nosso sangue; e o pão, fruto também da criação, é o seu corpo, que fortalece o nosso corpo.
 Portanto, quando o cálice de vinho misturado com água e o pão natural recebem a palavra de Deus, transformam-se na eucaristia do sangue e do corpo de Cristo. São eles que alimentam e revigoram a substância de nossa carne. Como é possível negar que a carne é capaz de receber o dom de Deus, que é a vida eterna, essa carne que se alimenta com o sangue e o corpo de Cristo e se torna membro do seu corpo?
 O santo Apóstolo diz na Carta aos Efésios: Nós somos membros do seu corpo (Ef 5,30), da sua carne e de seus ossos (cf. Gn 2,23); não é de um homem espiritual e invisível que ele fala – o espírito não tem carne nem ossos (cf. Lc 24,39) – mas sim do organismo verdadeiramente humano, que consta de carne, nervos e ossos, que se nutre com o cálice do seu sangue e se robustece com o pão que é seu corpo.
 O ramo da videira plantado na terra, frutifica no devido tempo, e o grão de trigo, caído na terra e dissolvido, multiplica-se pelo Espírito de Deus que sustenta todas as coisas. Em seguida, pela arte da fabricação, são transformados para uso do homem.  Recebendo a palavra de Deus, tornam-se a eucaristia, isto é, o corpo e o sangue de Cristo. Assim também os nossos corpos, alimentados pela eucaristia, depositados na terra e nela desintegrados, ressuscitarão a seu tempo, quando o Verbo de Deus lhes conceder a ressurreição para a glória do Pai. É ele que reveste com sua imortalidade o corpo mortal e dá gratuitamente a  incorruptibilidade à carne corruptível. Porque é na fraqueza que se manifesta o poder de Deus.

quarta-feira, 29 de abril de 2020

Quarta-feira da 3ª semana da Páscoa

 Segunda leitura
Da Primeira Apologia em defesa dos cristãos, de São Justino, mártir
(Cap.61:PG 6,419-422)   
(Séc.I)
O banho do novo nascimento
 Vamos expor de que modo, renovados por Cristo, nos consagramos a Deus. Todos os que estiverem convencidos e acreditarem no que nós ensinamos e proclamamos, e prometerem viver de acordo com essas verdades, exortamo-los a pedir a Deus o perdão dos pecados, com orações e jejuns; e também nós rezaremos e jejuaremos unidos a eles.
 Em seguida, levamo-los ao lugar onde se encontra água; ali renascem do mesmo modo que nós também renascemos: recebem o batismo da água em nome do Senhor Deus Criador de todas as coisas, de nosso Salvador Jesus Cristo e do Espírito Santo.
 Com efeito, foi o próprio Jesus Cristo que afirmou: Se não renascerdes, não entrareis no reino dos céus (cf. Jo 3,3.5). É evidente que não se trata, uma vez nascidos, de entrar novamente no seio materno.
 O profeta Isaías também diz àqueles que pecaram e se arrependem, como libertar-se das culpas. São estas as suas palavras: Tirai a maldade de vossas ações de minha frente. Deixai de fazer o mal! Aprendei a fazer o bem! Julgai a causa do órfão,  defendei a viúva. Vinde, debatamos – diz o Senhor. Ainda que vossos pecados sejam como púrpura, tornar-se-ão brancos como a neve. Se não me ouvirdes, uma espada vos destruirá. Assim falou a boca do Senhor (cf. Is 1,16-20).
  Esta doutrina, nós a recebemos dos apóstolos. No nosso primeiro nascimento, fomos gerados por um instinto natural, na mútua união de nossos pais, sem disso termos consciência. Fomos educados no meio de uma sociedade desonesta e em maus costumes. Todavia, para termos também um nascimento que não seja fruto da simples natureza e da ignorância, mas sim de uma escolha consciente, e obtermos pela água o perdão dos pecados cometidos, sobre aquele que quiser renascer e fizer penitência dos pecados, é pronunciado o nome do Senhor Deus Criador de todas as coisas. Somente podemos invocar este nome sobre aquele que é levado à água do batismo.
 A ninguém é permitido pronunciar o nome inefável de Deus. Se alguém ousa afirmar ter em si este nome, não passa de um louco. A este batismo dá-se também o nome de “iluminação”, porque os iniciados nesta doutrina são iluminados na sua capacidade de compreender as coisas. Mas a purificação daquele que é iluminado, faz-se em nome de Jesus Cristo, crucificado sob Pôncio  Pilatos, e em nome do Espírito Santo que, pelos profetas predisse tudo quanto dizia respeito a Jesus.

terça-feira, 28 de abril de 2020

Terça-feira da 3ª semana da Páscoa

Segunda leitura
Dos Sermões de Santo Agostinho, bispo
 (Sermo 34,1-3.5-6:CCL41,424-426)   
(Séc.V)
 Cantemos ao Senhor o canto do amor
 Cantai ao Senhor Deus um canto novo, e o seu louvor na assembleia dos fiéis (Sl 149,1).
 Somos convidados a cantar um canto novo ao Senhor. O homem novo conhece o canto novo. O canto é uma manifestação de alegria e, se examinarmos bem, é uma expressão de amor. Quem, portanto, aprendeu a amar a vida nova, aprendeu também a cantar o canto novo. É, pois, pelo  canto novo que devemos reconhecer o que é a vida nova. Tudo isso pertence ao mesmo Reino:  o homem novo, o canto novo, a aliança nova.
 Não há ninguém que não ame. A questão é saber o que se deve amar. Não somos, por  conseguinte, convidados a não amar, mas sim a escolher o que havemos de amar. Mas o que  podemos escolher, se antes não formos escolhidos? Porque não conseguiremos amar, se antes  não formos amados. Escutai o apóstolo João: Nós amamos porque ele nos amou primeiro (cf.  1Jo 4,10). Procura saber como o homem pode amar a Deus; não encontrarás resposta, a não ser  esta: Deus o amou primeiro. Deu-se a si mesmo aquele que amamos, deu-nos a capacidade de  amar. Como ele nos deu esta capacidade, ouvi o apóstolo Paulo que diz claramente: O amor de  Deus foi derramado em nossos corações. Por quem? Por nós, talvez? Não. Então por quem? Pelo Espírito Santo que nos foi dado (Rm5,5).
 Tendo, portanto, uma tão grande certeza, amemos a Deus com o amor que vem de Deus.  Escutai ainda mais claramente o mesmo São João: Deus é amor: quem permanece no amor,  permanece com Deus, e Deus permanece com ele (1Jo 4,16). É bem pouco afirmar: O amor  vem de Deus (1Jo,4,7). Quem de nós se atreveria a dizer: Deus é amor? Disse-o quem sabia o  que possuía.
  Deus se oferece a nós pelo caminho mais curto. Clama para cada um de nós: Amai-me e me possuireis; porque não podeis amar-me se não me possuirdes.
 Ó irmãos, ó filhos, ó novos rebentos da Igreja católica, ó geração santa e celestial, que  renascestes em Cristo para uma vida nova! Ouvi-me, ou melhor, ouvi através do meu convite: Cantai ao Senhor Deus um canto novo. Já estou cantando, respondes. Tu cantas, cantas bem,  estou escutando. Mas oxalá a tua vida não dê testemunho contra tuas palavras.
 Cantai com a voz, cantai com o coração, cantai com os lábios, cantai com a vida: Cantai ao  Senhor Deus um canto novo. Queres saber o que cantar a respeito daquele a quem amas? Sem  dúvida, é acerca daquele a quem amas que desejas cantar. Queres saber então que louvores irás cantar? Já o ouviste: Cantai ao Senhor Deus um canto novo. Que louvores? Seu louvor na assembleia dos fiéis. O louvor de quem canta é o próprio cantor.
 Quereis cantar louvores a Deus? Sede vós mesmos o canto que ides cantar. Vós sereis o seu  maior louvor, se viverdes santamente.

segunda-feira, 27 de abril de 2020

Segunda-feira da 3ª semana da Páscoa

Segunda leitura

Do Comentário à Primeira Carta de São Pedro, de São Beda Venerável, presbítero

(Cap.2:PL93,50-51)
(Séc.VIII)

Raça escolhida, sacerdócio do Reino

Vós sois a raça escolhida, o sacerdócio do Reino (1Pd 2,9). Este elogio foi feito outrora por Moisés ao antigo povo de Deus. Agora com maior razão, o apóstolo Pedro o aplica aos pagãos pois acreditaram em Cristo, que como pedra angular, reuniu todos os povos na mesma salvação que fora dada a Israel. Chama-os de raça escolhida, por causa da fé que os distingue daqueles que, rejeitando a pedra viva, acabaram sendo eles mesmos rejeitados.

Chama-os também sacerdócio do Reino, porque estão unidos ao corpo daquele que é o supremo rei e verdadeiro sacerdote. Como rei torna-os participantes do seu reino e, como sacerdote, purifica-os dos pecados pelo sacrifício do seu sangue. Chama-os sacerdócio do Reino para que se lembrem de esperar o reino eterno e ofereçam continuamente a Deus o sacrifício de uma conduta irrepreensível.

São ainda chamados nação santa e povo que ele conquistou (1Pd 2,9), de acordo com o que diz o apóstolo Paulo, comentando uma passagem do Profeta: O seu justo viverá por causa de sua fidelidade, mas se esmorecer, não encontrarei mais satisfação nele. Nós não somos desertores, para a perdição. Somos homens de fé, para a salvação da alma (Hb 10,38-39). E nos Atos dos Apóstolos: O Espírito Santo vos colocou como guardas para pastorear a Igreja de Deus, que ele adquiriu com o sangue de seu próprio Filho (At 20,28).

Portanto, o sangue de nosso Redentor fez de nós um povo que ele conquistou, como outrora o sangue do cordeiro libertou do Egito o povo de Israel. Eis por que, no versículo seguinte, recordando o significado místico da antiga história, Pedro ensina que ela deve ser realizada espiritualmente pelo novo povo de Deus, acrescentando: Para proclamar suas obras admiráveis (cf. 1Pd 2,9). De fato, os que foram libertados da escravidão do Egito por Moisés, entoaram ao Senhor um cântico de vitória, depois de terem atravessado o mar Vermelho e afogado o exército do Faraó. Do mesmo modo, também nós, depois de termos recebido no batismo o perdão dos pecados, devemos agradecer dignamente os benefícios celestes.

Os egípcios que afligiam o povo de Deus, e por isso eram símbolo das trevas e tribulações, representam muito bem os pecados que nos oprimiam, mas que foram lavados pelas águas do batismo. A libertação dos filhos de Israel e a sua caminhada para a terra outrora prometida, têm íntima relação com o mistério da nossa redenção; por ela nos dirigimos para os esplendores da morada celeste, sob a luz e direção da graça de Cristo. Esta luz da graça foi também prefigurada por aquela nuvem e coluna de fogo que, durante toda a peregrinação pelo deserto defendeu os israelitas das trevas da noite e os conduziu através de veredas indescritíveis para a pátria prometida.

domingo, 26 de abril de 2020

Domingo da 3ª semana da Páscoa

Segunda leitura

Da Primeira Apologia a favor dos cristãos, de São Justino, mártir

(Cap.66-67: PG 6,427-431)
(Séc. I)

A celebração da Eucaristia

A ninguém é permitido participar da Eucaristia, a não ser àquele que, admitindo como verdadeiros os nossos ensinamentos e tendo sido purificado pelo batismo para a remissão dos pecados e a regeneração, leve uma vida como Cristo ensinou. Pois não é pão ou vinho comum o que recebemos. Com efeito, do mesmo modo como Jesus Cristo, nosso salvador, se fez homem pela Palavra de Deus e assumiu a carne e o sangue para a nossa salvação, também nos foi ensinado que o alimento sobre o qual foi pronunciada a ação de graças com as mesmas palavras de Cristo e, depois de transformado, nutre nossa carne e nosso sangue, é a própria carne e o sangue de Jesus que se encarnou.

Os apóstolos, em suas memórias que chamamos evangelhos, nos transmitiram a recomendação que Jesus lhes fizera. Tendo ele tomado o pão e dado graças, disse: Fazei isto em memória de mim. Isto é o meu corpo (Lc 22,19; Mc 14,22); e tomando igualmente o cálice e dando graças, disse: Este é o meu sangue (Mc 14,24), e os deu somente a eles. Desde então, nunca mais deixamos de recordar estas coisas entre nós. Com o que possuímos, socorremos a todos os necessitados e estamos sempre unidos uns aos outros. E por todas as coisas com que nos alimentamos, bendizemos o Criador do universo, por seu Filho Jesus Cristo e pelo Espírito Santo.

No chamado dia do Sol, reúnem-se em um mesmo lugar todos os que moram nas cidades ou nos campos. Lêem-se as memórias dos apóstolos ou os escritos dos profetas, na medida em que o tempo permite. Terminada a leitura, aquele que preside toma a palavra para aconselhar e exortar os presentes à imitação de tão sublimes ensinamentos.

Depois, levantamo-nos todos juntos e elevamos as nossas preces; como já dissemos acima, ao acabarmos de rezar, apresentam-se pão, vinho e água.Então o que preside eleva ao céu, com todo o seu fervor, preces e ações de graças, e o povo aclama: Amém. Em seguida, faz-se entre os presentes a distribuição e a partilha dos alimentos que foram eucaristizados, que são também enviados aos ausentes por meio dos diáconos.

Os que possuem muitos bens dão livremente o que lhes agrada. O que se recolhe é colocado à disposição do que preside. Este socorre os órfãos, as viúvas e os que, por doença ou qualquer outro motivo se acham em dificuldade, bem como os prisioneiros e os hóspedes que chegam de viagem; numa palavra, ele assume o encargo de todos os necessitados.

Reunimo-nos todos no dia do Sol, não só porque foi o primeiro dia em que Deus, transformando as trevas e a matéria, criou o mundo, mas também porque neste mesmo dia Jesus Cristo, nosso salvador, ressuscitou dos mortos. Crucificaram-no na véspera do dia de Saturno; e no dia seguinte a este, ou seja, no dia do Sol,aparecendo aos seus apóstolos e discípulos, ensinou-lhes tudo o que também nós vos propusemos como digno de consideração.