Sexta-feira da 2ª semana da Quaresma
Segunda leitura
Do Tratado contra as heresias, de Santo Irineu, bispo
(Lib. 4,16,2-5:SCh100,564-572)
(Séc.II)
A aliança do Senhor
No Deuteronômio, Moisés disse o seguinte ao povo: O Senhor
teu Deus firmou uma aliança no Horeb. Não foi com vossos pais que o
Senhor firmou esta aliança, mas convosco (Dt 5,2-3). Por que
não firmou a aliança com seus pais? Porque a lei não foi feita para o
justo (1Tm1,9). Ora, seus pais eram justos; tinham o conteúdo do
Decálogo gravado em seus corações e em suas almas, pois amavam a Deus
que os criara e abstinham-se de toda injustiça para com o próximo. Não
precisavam da advertência de uma lei escrita, porque tinham em si
mesmos a justiça da Lei.
Mas, quando essa justiça e esse amor para com Deus caíram no
esquecimento e se extinguiram no Egito, tornou-se necessário que Deus,
em sua grande bondade para com os homens, se manifestasse de viva voz.
Com seu poder fez sair seu povo do Egito, para que o homem voltasse a
ser discípulo e seguidor de Deus; e castigou os desobedientes, a fim de
que o povo não desprezasse o seu Criador.
Alimentou-o como maná, para que recebesse um alimento
espiritual, conforme disse também Moisés no Deuteronômio: Ele te
alimentou com o maná, que nem tu nem teus pais conheciam, para te
mostrar que nem só de pão vive o homem, mas de toda palavra que sai da
boca do Senhor (Dt 8,3). Deu ainda o mandamento do amor de Deus, e
ensinou a justiça para com o próximo, a fim de que o homem não fosse
injusto nem indigno de Deus. Assim, por meio do Decálogo, Deus
preparava o homem para a sua amizade e para a concórdia com o próximo.
Era o homem que tirava proveito de tudo isso, uma vez que Deus não
tinha nenhuma necessidade do homem.
Efetivamente,tudo isso contribuía para a glória do homem, dando
o que lhe faltava, isto é, a amizade de Deus. Porém, isto nada
acrescentava a Deus, pois ele não tinha necessidade do amor do homem. O
homem é que precisava da glória de Deus, a qual de modo algum poderia
obter senão servindo a Deus. Por isso, Moisés lhe disse de novo: Escolhe,
pois, a vida, para que vivas, tu e teus descendentes, amando ao Senhor
teu Deus, obedecendo à sua voz e apegando-te a ele – pois é a tua vida
e prolonga os teus dias (Dt 30,19-20). A fim de preparar o homem
para esta vida, o Senhor proclamou por si mesmo as palavras do
Decálogo, para todos sem exceção; por isso elas não foram abolidas por
ocasião da sua vinda segundo a carne, mas permanecem em vigor entre
nós, desenvolvidas e amplificadas.
Quanto aos preceitos próprios da servidão, Deus prescreveu-os
separadamente ao povo, por intermédio de Moisés, adaptados à sua
educação e formação, conforme disse o próprio Moisés: Naquele
tempo, vos ensinei leis e decretos conforme o Senhor Deus me ordenou
(cf. Dt 4,5). Por isso, os preceitos, que implicavam a servidão e
tinham o caráter de sinais, foram abolidos pelo Senhor na Nova Aliança
da liberdade. Mas os preceitos naturais, que convêm a homens livres e
são comuns a todos, foram completados e aperfeiçoados, concedendo
generosamente aos homens o dom de conhecer a Deus como Pai adotivo,
amá-lo de todo o coração e seguir seu Verbo sem se desviarem.
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