Do Tratado contra as heresias, de Santo Irineu, bispo
(Lib. 4,20, 4-5: SCh 100, 634-640)
(Séc. II)
Com
a vinda de Cristo, Deus torna-se visível aos homens
Há um só Deus que, por sua Palavra e Sabedoria, criou e harmonizou todas as coisas.
Sua Palavra é nosso Senhor Jesus Cristo, que nos
últimos tempos se fez homem entre os homens, para unir o fim ao princípio, isto
é, o homem a Deus.
Por isso, os profetas, que tinham recebido dessa mesma
Palavra o carisma profético, anunciaram sua vinda segundo a carne; mediante
essa vinda, realizou-se a união e a comunhão de Deus com o homem, conforme a
vontade do Pai. Desde o começo a Palavra de Deus tinha anunciado que Deus seria
visto pelos homens, que viveria e conversaria com eles na terra, que se faria
presente à sua criatura, para salvá-la e ser percebido por ela, livrando-nos das
mãos de todos os que nos odeiam (Lc 1,71), isto é, de todo o espírito de
pecado, e fazendo que o sirvamos em justiça e santidade enquanto perdurarem nossos dias
(Lc 1,74-75). E assim, unido ao Espírito de Deus, o homem tenha acesso à glória
do Pai.
Os profetas anunciavam que Deus seria visto pelos
homens, conforme diz também o Senhor: Felizes os puros de coração, porque verão a Deus (Mt
5,8).
Contudo, ninguém pode ver a Deus na sua grandeza e
glória inenarrável e continuar vivendo (cf. Ex 33,20), porque o Pai é inacessível. Mas
em seu amor, sua bondade e sua onipotência, ele chega a conceder aos que o amam
o dom de ver a Deus; é isto que anunciavam os profetas, pois o que é
impossível aos homens, é possível a Deus (Lc 18,27).
O homem, por si mesmo, não poderá ver a Deus. Mas
Deus, se quiser, será visto pelos homens, por aqueles que ele quiser, quando e
como quiser. Deus, que tudo pode, foi visto outrora em visão profética por meio
do Espírito, deixa-se ver agora por meio de seu Filho, graças à adoção filial,
e será visto finalmente no reino dos céus como Pai. Com efeito, o Espírito
prepara o homem para o Filho de Deus, o Filho conduz o homem para o Pai e o Pai
lhe dá a imortalidade na vida eterna, que é fruto da contemplação de Deus.
Assim como os que vêem a luz estão na luz e recebem a
sua claridade, também os que vêem a Deus estão em Deus e recebem a sua
claridade. A claridade de Deus vivifica; portanto, os que vêem a Deus recebem a
vida.
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