Segunda leitura
Das Homilias, de São Gregório de Nissa, bispo
(Orat. 6 De beatitudinibus: PG 44,1263-1266)
(Séc. IV)
Deus é um rochedo inacessível
O que costuma acontecer a quem do alto de
um monte olha para o vasto mar lá embaixo, isto mesmo se dá com o meu espírito
em relação à altíssima palavra do Senhor: dessa altura olho para a inexplicável
profundidade de seu sentido.
A mesma vertigem que se pode sentir em
alguns lugares da costa, quando se olha desde uma grande elevação a cavaleiro
das ondas para o mar profundo, do alto saliente de um penhasco que, do lado do
mar, parece cortado pelo meio do vértice até a base mergulhada nas profundezas,
sobrevém a meu espírito suspenso à grande palavra proferida pelo Senhor: Bem-aventurados
os puros de coração, porque verão a Deus. Deus se oferece à visão
daqueles que têm o coração purificado. Deus, ninguém jamais o viu,
diz o grande João. Confirma esta asserção, Paulo, aquele espírito
sublime: A quem homem algum vê nem pode ver. Eis aqui o penhasco,
escorregadio, despenhadeiro sem fundo, talhado a pique, que não oferece em si
nenhum ponto de apoio para a inteligência da criatura! O próprio Moisés
sentiu-se esmagado pela palavra: Não há, diz ele, quem
veja a Deus e continue a viver. Ele sentenciou que este penhasco é
inacessível, porque nunca nossa mente pode lá chegar, por mais que se esforce
por alcançá-lo, erguendo-se até ele.
Ora, ver a Deus é gozar a vida eterna. No
entanto, que Deus não possa ser visto, as colunas da fé, João, Paulo e Moisés,
o afirmam. Percebes a vertigem que arrasta logo o espírito para as profundezas
do conteúdo desta questão? De fato, se Deus é a vida, quem não vê a Deus não vê
a vida. Mas que não se possa ver a Deus, tanto os profetas quanto os apóstolos,
levados pelo Espírito divino, o atestam. Em que angústias, portanto, se debate
a esperança dos homens?
Contudo, o Senhor vem erguer e sustentar a
esperança vacilante, assim como fez a Pedro, a ponto de afundar, firmando-o na
água tornada resistente ao caminhar, para que ele não se afogasse.
Portanto, se a mão do Verbo se estender
para nós, que vacilamos no abismo de nossas especulações, colocando-nos em
outra perspectiva, perderemos o medo e, já seguros, abraçaremos o Verbo que nos
conduz como que pela mão, dizendo: Bem-aventurados os puros de coração
porque eles verão a Deus.
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